terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Da série Random Music - Música Pequena

Em 1996 eu estava estudando no colégio Pitágoras e passando pelo pior ano da minha vida. Meu avô no UTI enfartado (se recuperou), muitos membros da minha família na minha casa por causa disso (climão), eu dormindo no quarto da empregada e sendo extremamente mal recebido (leia-se gente me esperando na saída todo dia) pelos agroboys do Pitágoras que não gostavam de gente nova. Se eu pudesse apertar delete em um ano da minha vida seria 1996, na verdade fiz quase isso (não mantenho nenhuma das poucas amizades que fiz neste ano e isso foi de certa forma consciente).

Nessa época eu ainda comprava cds. Comprar cd comanda, eu acho até hoje; só que não compro. Uma das mehores sensações do mundo era tirar aquele plático do cd novo, colocar no som alto e ser literalmente espancado por algo que não era para ser tão bom. Um dia fui até o centro de a pé (como eu sempre fazia), e voltei de ônibus (já com uma febre que viria a se tornar muito forte naquele dia) com o cd novo dos Stone Temple Pilots na mão. Esse disco não tinha o direito de ser tão bom e mesmo padecendo de febre na cama e escutando num aparelho de som pequeno (e ruim) percebi que ia entrar direto entre os melhores discos da decada de 90. E quanto mais o tempo passou mais eu confirmo isso.

Stone Temple Pilots foi formado por uns moleques que se conheceram em um show do Black Flag e queriam uma banda que tivesse os mesmos inicias de um adesivo que todo mundo tinha no skate (STP, de uma firma de óleo - Scientifically Treated Petroleum - porque todo mundo amava esse adesivo vai saber). Chegaram a se chamar Shirley Temple's Pussy (uahauhauaha) por isso e por pressão da gravadora mantiveram a sigla com Pilotos do Templo de Pedra. No início era sub produto sim - sub produto do grunge que estava estourando na época, cópia não muito grande coisa principamente de Pearl Jam. Chamava atenção por ser "a banda grunde que não era de Seattle" e emplacou sinistramente o disco Core que vendeu 8X platina e tocava igual louco na MTV e rádio rock. Nunca me interessei por essa época e se tivesse ficado nisso provavelmente nunca teria ido no centro naquele dia, mas os fdp tinham talento e depois de chamar atenção de uma maneira meio que forçada já no segundo disco socaram personalidade no negócio e começaram a se tornar algo interessante.

O Purple se afastou do grunge cópia e moveu um bocado para o lado do rock clássico pura e simplesmente e não teve medo nenhum de injetar (bom) pop no som da banda. O segredo do bom pop é esse - sem vergonha de ser pop e assumir que é pop, mas no caso deles feito por uns caras com a cabeça metade na década de 70 e metade tentando fazer um som que se tornaria o novo rock e como tinham boas ferramentas para isso (um ótimo vocalista tão interessado em rockão burrão quanto em viagens artísticas do David Bowie e um guitarrista excelente e original que para mim nunca foi suficentemente reconhecido) acabou com isso colocando coisa muito boa na FM para todo mundo ouvir - o que acontece muitíssimo raramente. Dessa época vem muita coisa que toca na rádio até hoje - Interstate Love Song, Vasoline, Big Empty - e mesmo sendo um disco bacana pelo Purple não dava para antecipar que eles iam chutar o balde e entrar no estúdio para fazer um disco rockeirão, bem mais simples e direto na veia que os anteriores, dando vazão a toda viagem que passar pela cabeça porém sem super produção nenhuma.

O Tiny Music - o disco que eu comprei no centro - me parece produto de uma banda fechada na garagem sozinha e interessada em ir direto no assunto, sem complicar em excesso mas ao mesmo tempo sem censurar nenhuma idéia. Esse foi O disco em que o Stone Temple Pilots, afinal, não se parecia com nada a não ser eles mesmos, ou seja, acharam o som, o que é sempre um momento mágico. Foi uma fórmula tão foda que eles próprios nunca conseguiram repetir, e até hoje é um dos poucos discos que eu conheço que (como o Transformer do Lou Reed por exemplo) soam atemporais, ou seja, se eu falar que é de 1974 você vai acreditar, se eu falar que saiu ontem você vai acreditar. Além disso, é daqueles discos raros (de novo, como o Transformer do Lou Reed ou o Astral Weeks do Van Morrison) que parece que saíram inteirinhos de improviso, sem esforço nenhum do criador, pela naturalidade e espontaniedade do que você escuta sem saber que é esse o tipo de disco que dá mais trabalho para fazer. É obra de arte que dá muitas leituras: se quiser pode ouvir como um disco de rock da porra sujo e barulhento, dá para ouvir como disco pop, dá para dançar e escutar sozinho no quarto, colocar em uma festa ou tocar no rádio, e ainda assim vai interessar quem detesta música comercial. Tudo ao mesmo tempo e de várias camadas como toda boa obra de arte.

Música simples porém muito variada, 100% direto ao ponto feito por uma banda talentosa passando por sua fase mais criativa. Raríssimo e para mim um dos destaques da década de 90.

A partir daí, só ladeira abaixo: o vocalista Scott Weiland virou a Amy Winehouse (notícia de prisão/overdose/porrada/batida de carro todo dia), banda sem poder fazer turnê por causa dele, gravando o disco IV (também muito bom, sendo que "IV" é tanto "4" quanto "Intra Venoso") na pressa antes do Scott ter que passar uma temporada na cadeia, separam, gravam coisas ignoradas sem o vocalista, voltam, gravam um disco meia boca (Shangri-la Dee Da) e acabam de uma forma triste, inclusive com ele sendo desperdiçado no Velvet-Revolver-Guns-And-Roses-2.0-ninguém-merece. Melancólico, mas não apaga a obra anterior e não morre a esperança de sair algo legal de agora que eles voltaram. O espírito deve estar lá em algum lugar. E de certa forma me ajudou a passar por 1996.

Fácil de gostar e ainda assim profundo, pop mas pesado, pesado mas bonito, bem feito e imperdível - Tiny Music
Pesadão - IV
Grunge pop na veia mas talvez o único exemplo de BOM grunge pop - Purple
Só escute quando você já for bem fã - os outros

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