sexta-feira, 20 de junho de 2008

As gravadoras subiram no telhado - parte 2/2

Continuando o post anterior: na prática nosso modelo de indústria cultural conduz a um contexto bem fraco do ponto de vista artístico. O que temos é um contexto que só dá abertura real para repetições de coisas que já deram certo (olha uma indústria como a de games ou a do cinema), favorece somente o que é fácil e imediato, e consequentemente poda criatividade e de forma geral enfraquece a cultura.
Outra coisa que é extremamente destrutiva na minha opinião é como a lei do copyright funciona. Sinceramente? Eu acho que copyright tem que existir só para evitar que eu pegue o cd dos Strokes, troque a capa e venda como se fosse um cd da minha banda ou se a música está explicitamente sendo usada para vender outra produto (por exemplo, num comercial de jeans). Fora isso, todas as outras aplicações de copyright para mim é frescura ou pior, GANÂNCIA.

Fala sério: porque se importar se uma banda gravou um cover de uma música sua no cd deles? Isso NÃO vai prejudicar as vendas da sua versão, muito provavelmente vai até ajudar. Porque ficar chorando se um cantor de hip hop sampleou um trecho de 5 segundos da sua música para usar na dele? Da mesma forma, isso NÃO vai prejudicar a sua versão. Maior grau de liberdade entre os artistas e suas obras enriquece e é legal para todo mundo.

Vários exemplos: o (ótimo) segundo cd dos Beastie Boys (Paul's Boutique) é frequentemente tido como exemplo de disco que NÃO poderia ser feito hoje. Tem tanto sampler de tanta coisa diferente que seria proibitivo em relação ao custo de licenciamento. Mesmo exemplo: (ótimo) primeiro disco do Go! Team teve que ser praticamente refeito quando eles deixaram de ser independentes. Uma banda massa como o Girl Talk é no fundo ilegal (só trabalha com samplers e mistura de músicas), eles não se importam mas vão acabar tomando ferro e acabando.

Acho isso DEPRÊ. Bons discos que NÃO PODEM existir para atender a essa lei de copyright ridícula e gananciosa.
Quer saber uma coisa milenar que se não existisse e se fosse proposta a sua criação hoje NUNCA ia ser aceito? Biblioteca. "O quê? As pessoas vão poder ler livros sem pagar para o autor? Que idéia é essa??"

É pensando em bibliotecas que eu baseio minha filosofia em relação a indústria cultural. Bibliotecas não prejudicam as editoras e são boas para a sociedade porque você não é obrigado a ter dinheiro para adquirir conhecimento. E quanto mais gente tiver mais conhecimento, melhor para a sociedade. Quanto mais gente tiver mais cultura com mais facilidade, melhor para a sociedade.
Por isso eu acho que gravadoras tem que morrer (e vão).
Um modelo ideal de indústria musical seria cada um grava o que quiser (sem pressão de gravadora para seguir uma direção comercial específica), cada um escuta o que quiser, com facilidade e sim, SEM PAGAR NADA.

Vai ferrar o artista? Não, porque ele já é ferrado pela gravadora. Quem faz grana com cds é gravadora, o percentual que vai para o artista é mínimo do mínimo. Talvez o modelo do In Rainbows seja o ideal - pague quanto quiser pelo download (inclusive não pague se for o caso) - mas você está dando dinheiro DIRETO para banda, sem intermediários. Eu acredito que o número de pessoas que não vão comprar o cd é compensado pelo número de pessoas adicional que nunca iriam ouvir sua banda e agora vão - isso vai te ajudar a longo prazo, quanto maior sua base de fãs maior a chance de fazer dinheiro de diversas maneiras.

Isso provoca pânico porque é mudança, é novo, e o instinto básico de todo mundo é não querer mudar. Se o download de músicas afetou mesmo a venda de cds é discutível (tem vários estudos contraditórios), mas tanto melhor se tiver afetado. Esse modelo "ideal" que eu descrevi acima não está distante - eu diria que já andou 70% do que tinha que andar e vai concluir quando as grandes gravadoras fecharem ou passarem a operar de maneira totalmente diferente de hoje (e mexerem na porcaria da lei do copyright).

E digo mais: faça tudo que puder para acelerar isso. No mínimo, não compre mais cds (pelo menos só compre os independentes).
Isso é motivo para comemorar.
O efeito prático: daqui a alguns anos teremos um ambiente cultural muito mais forte, rico e interessante para todo mundo. Estou sendo otimista mesmo! Tomara que EU não caia do telhado.

6 comentários:

Anônimo disse...

Permitam eu me apresentar, porque eu nao conheço o Lele. Só ouvi falar dele pelo Luis (me mostrando uma conversa do MSN sobre punk rock) e pelo Aleja (me pedindo uma música dos Misfits depois de ler o blog). Provavelmente nos pecharemos no casório do Luis.

Enfim, esse post me lembrou uma música do caralho do NOFX:

Kick back watch it crumble
See the drowning, watch the fall
I feel just terrible about it
That's sarcasm, let it burn

I'm gonna make a toast when it falls apart
I'm gonna raise my glass above my heart
Then someone shouts "That's what they get!"

For all the years of hit and run
For all the piss broke bands on VH1
Where did all, their money go?
Don't we all know

Parasitic music industry
As it destroys itself
We'll show them how it's supposed to be

Music written from devotion
Not ambition, not for fame
Zero people are exploited
There are no tricks, up our sleeve

Gonna fight against the mass appeal
We're gonna kill the 7 record deal
Make records that have more than one good song
The dinosaurs will slowly die
And I do believe no one will cry
I'm just fucking glad I'm gonna be
There to watch the fall

Prehistoric music industry
Three feet in la brea tar
Extinction never felt so good

If you think anyone would feel badly
You are sadly, mistaken
The time has come for evolution
Fuck collusion, kill the five

Whatever happened to the handshake?
Whatever happened to deals no-one would break?
What happened to integrity?
It's still there it always was
For playing music just because
A million reasons why

(All) dinosaurs will die
(All) dinosaurs will die
(All) dinosaurs will die

Luiz Augusto disse...

Pô Vinicius, escreve meu nome certo!

:p

Concordo que as gravadoras vão acabar e concordo que do jeito q são hoje estão só atrapalhando mesmo. MAS, vamos nos lembrar que, antes do ADVENTO da internet e da facilidade de transmissão de informações de qq lugar pra qq lugar, eram as gravadoras que "transportavam" a música. Tiveram um papel importante nesse aspecto e com certeza ajudaram inclusive a criar o cenário q tá aí hoje, provavelmente contribuindo pra própria destruição. Talvez se tivessem adotado políticas\posturas melhores, não estariam tão fadadas à extinção, mas na verdade acho q o q tá acontecendo hoje com as gravadoras tem tudo a ver com a história do leão velho: fica mais agressivo do q nunca pq sabe q tá fraco e perto da morte.

Mas enfim, desenvolvimento é assim em relação a tudo, as versões velhas contribuem e ajudam a construir pra depois serem ultrapassadas e deixadas de lado em favor de coisas ainda melhores, criadas e construidas por gerações que um dia também tornar-se-ão velhas (MAZAH, GASTEI o português).

Anônimo disse...

Errata: onde se lê "Luis", substituir por "Luiz".

GraveRisen disse...

Gravadora nunca foi "boazinha". Passaram simplesmente de mal necessário que era tolerado por falta de opção para mal desnecessário que vai morrer ;-)

André Carneiro disse...

Olha, eu não tinha lido ainda estes comentários quando escrevi minha visão do papel da gravadora no post anterior. Tem a ver com o que o Luiz falou.

Então, sobre outros aspectos, deste último post:

Bibliotecas: Embora existam há muito tempo, é um modelo de negócio muito mais atual do que a gente pensa. Provavelmente elas vieram à frente do tempo. É um modelo que torna a cultura acessível. Qual o sentido de todo mundo ter que ter os mesmos livros, sendo que você pode ter metade, seu vizinho metade, e trocarem? Afinal, o que importa é a leitura ou a venda?

Capitalismo: Entrará em colapso. Não sou socialista, mas é óbvio que o neoliberalismo está chegando ao fim. É um sistema que cria instabilidade e depende dela para sobreviver. A iniciativa privada não é capaz de resolver tudo. Prova disso é o que está acontecendo nos EUA, o ícone capitalista do planeta. Enquanto cada um tá embolsando, vai tudo muito bem. Na hora que a economia fica desestabilizada, grandes capitalistas (como banqueiros) começam a bambear as pernas, com medo de falência, o que eles fazem? Pedem socorro pro governo. "Papai, cuide de nós, senão nós vamos morrer. A gente disse que podia se virar sozinho, mas não era bem assim". O jovem EUA fugiu de casa na puberdade, aprontou com o mundo e disse que ia virar rei.

O modelo capitalista é instável. Cria essas coisas como Copyright, Eixo do Mal ou Ato Patriótico, mas é só para gerar renda. Porque trabalhar mesmo não é tão relevante, o lance é acumular capital (e tentar evitar que seu vizinho acumule muito).

André Carneiro disse...

* Onde escrevi renda, leia-se receita (faz mais sentido).

Finalizando. Socialismo se fudeu, capitalismo tá se fudendo também, e tá todo mundo se fudendo.

Acredito que uma hora surgirá um novo modelo, bem mais razoável. Só que falta a humanidade ser mais razoável primeiro.